22 de mai. de 2014

Amor Vira-Lata

Existem muitos tipos de amor.
Amor romântico, amor filial, amor de mãe.
Amor entre amigos, entre irmãos.

O amor, se verdadeiro e compartilhado por pessoas bem resolvidas, é uma dádiva da vida.
Mas em boa parte dos amores que vemos por aí não é bem assim e, muitas vezes, ocorrem ações no relacionamento que machucam e podem fazer com que a troca amorosa talvez não valha a pena, ou  pelo menos indiquem a necessidade de uma recauchutagem, parcial ou completa.

Digo isso porque notei, em muitas observações e experiências, um comportamento bastante frequente entre pares amorosos - um padrão de tratamento de um para com o outro - ao qual denominei "amor vira-lata", numa associação com um tipo comum de relação de donos com seus amigos peludos.

É claro que existem pessoas que tratam seus pets melhor que os humanos, mas este é outro caso...

Mas em que ponto, especificamente, se daria essa semelhança de tratamento?

O cachorrinho da relação!

De maneira geral, as pessoas adoram seus amigos peludos, e da alegria pura e simples que eles demonstram quando nos vê. Quem tem (ou teve) sabe: eles podem nos fazer sentir a pessoa mais especial do universo!

A chave é que essa relação homem-cão é desigual: o primeiro tem poder praticamente total sobre o segundo, podendo fazer quase tudo que deseja - mesmo infligir sofrimento - sem muitas possibilidades de que sejam geradas consequências. Essa é a verdade e um perigo para o mais fraco da relação.

Na dinâmica relacional do dia-a-dia entre eles, quando está de bom humor o dono brinca com seu totó, o afaga, aperta e até fala com aquela voz infantilizada. E o "au au" adora, apreciando intensamente tudo que recebe.

Mas num "belo" dia, o dono retorna irritado para casa. E grita com ele, ralha com ele, bate nele, manda deitar! Como diz a expressão popular, chega "chutando o cachorro".

Enfim, usa o pobre e confuso animal para descarregar as mazelas que acumulou no dia.

Mais tarde, o dono muda de humor e sente-se culpado ao ver o totó amuado em um canto, e volta com os afagos, agrados e novamente aquela "voz" que a titia faz para o bebê. E o ciclo se repete com o passar do tempo.

E o pobre animal (canis ou homus) só sente a confusão se instalar por não saber como agir, o que fez de errado, como se portar.

E assim, com um dos dois sendo tratado com carinhos e beijinhos em um dia, e como lixo em outro, constrói-se o amor vira-lata, que nem é tão incomum quanto se pode pensar num primeiro momento.
Começa em casa com os o pai, a mãe ou os dois, agindo desta maneira com outro ser de baixo poder: os filhos. Pode ser desta maneira também com a relação irmão mais velho/irmão mais novo (ou quem sabe o inverso?). Com os namorados, esposa e esposo, amigos e colegas, professores e alunos.
Enfim, em toda relação mais próxima.

É a transformação do outro em um objeto pessoal. "Sou o dono teu: acarinho se me dá prazer, bato se me trouxer alívio, de acordo com minhas vontades" seria uma tradução deste comportamento. Num caso como este, pode-se afirmar seguramente que até os momentos de carinho são expressões egoístas. Todos temos dias ruins, mas quem ama de verdade segura seus impulsos de agressão em consideração e respeito a pessoa do outro.

Duvido que alguém, aqui e aí, nunca tenha passado por muitas experiências de ser o "vira-lata" ou o "mau dono"; afinal, tanto os seres com quem compartilhamos a vida mais intimamente como nós mesmos somos falhos, temos dias ruins e, pasmem, erramos de vez em quando.
A questão é a frequência e a intensidade com que acontecem.

Pode-se pensar - com grande probabilidade de acerto - que numa relação majoritariamente deste tipo os estragos são maiores do que naquela em que a agressão é a norma, pois gera grande confusão e conflitos internos. No primeiro você tem certeza do que está acontecendo e sabe, pelo menos, o que deveria fazer; no outro, se rasga na indecisão e na perplexidade.
(Ab initio: não fazer nada, no primeiro caso, é assumir a vira-latisse!).

Tendo isto em mente, devemos estar atentos para saber separar um caso esporádico de tratamento canino de uma relação em que este seja o padrão: o amor vira-lata trazendo uma vida de cachorro!

Se sua identificação foi com a dono bipolar, aproveite esta percepção e mude! Positive o status quo e ganhe um parceiro que saberá expressar o quão satisfeito está com as mudanças.

Lembre-se: as pequenas agressões, físicas ou psicológicas - são destrutivas (senão criminosas) e podem sair do controle, ganhando energia sem que se perceba, e abrir uma verdadeira Caixa de Pandora, de onde os males espalhados podem destruir muitas coisas (inclusive você mesmo!).

Se for você o vira-lata (ipso facto) da história, protestar é preciso! Mostre com clareza que não gostou de cada ato deste tipo - de preferência sem descontroles emocionais. Converse, seja franco, lata (ops, fale)!

As coisas não são simples na vida e nas relações, contudo...
Se não houver solução, melhor fugir ou trocar de dono!

Eu não sou cachorro não!

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